quarta-feira, 15 de junho de 2011

Nau babilônica, caravela de emoção*


Dos petardos esféricos dinamitando as redes por um certo Roberto
Estufando o cal dos corações dos meninos
Lusografias de elipses ensinando a amar o velho esporte bretão
Pelejas de sonhos, trocas de passes em preto-e-branco brilhando nas retinas joviais
Bandeiras esféricas nas arquibancadas
Cruz de malta em verde navegação no Maracanã nosso (ainda nosso?)
Vasco da Gama dos campos
Desbravadores das metas adversárias
Nos desconcertantes dribles de Mauricinho
Nos envenenados cruzamentos de Mazinho e Paulo Roberto
Nas arrancadas do então menino marrento da Vila da Penha
Depois melhor do Brasil, melhor do mundo, o baixinho Romário
Da raça e inteligência de Tita (e os gols comemorados no nosso templo com a camisa escondendo o rosto do Marco Trog)
Dos precisos, magistralmente certeiros lançamentos de Geovani
O balanço das redes do matador Sorato (e os gritos de Vasco na voz do Fabiano Cabeça durante o calor das nossas peladas)
Ah! É Edmundo! bradava como um animal o enr(l)ouquecido Rafael Pagador da Força
Dos estilosos gols do ex-chorão cracaço de bola Bebeto celebrados por André Manéu (craque vilipendiado ardilosamente do ninho do Urubu - em língua vascaína, time da favelada, framengo e demais pejorativos nomes direcionados ao rival maior -, em mais uma escusa, dentre tantas, várias, milhares manobras do ex-deputado Eu-rico Miranda)
Do épico título no chutaço com gosto de Cocada saboreado por Colibri
A ala esquerda de encanto e dribles desconcertantes da dupla Pedrinho-Felipe
O meio-campo cerebral dos Juninhos, o Paulista, e o Pernambucano, notoriamente e justamente decantado como o Reizinho (do Monumental de Nuñez gol de falta – chute certeiro, sensual e elegante como um tango – sobre o River Plate e ali a certeza de que se ganharia a Libertadores)

O vento sopra a caravela da memória e recorda-se da peculiar técnica de históricos beques da Colina, não aqueles da Barreira do Vasco de 1977 (Abel, Orlando, Zanata e Marco Antônio), mas sim outros, oitentistas e noventistas, dos trançados chutes para além da linha do Equador de Quiñones, e a objetividade séria, determinada e grosseira dos chutes para qualquer lado (porque todo jogo era de campeonato) de Odvan – o símbolo do zagueiro-zagueiro – sob o olhar assombrado do clássico e estilista da bola Mauro Galvão

Das calorosas discussões em preto-e-branco motivadas pelo deboche criativo de Zé do Carmo (tempos que os jogadores podiam tripudiar do adversário sem que isso se transformasse em declarações de guerra por torcedores melindrosos, ignorantes e embrutecidos, por sinal, e triste sinal, intransigentes e violentos, do futebol cada vez mais chato, falso e fresco travestido de politicamente correto dos dias atuais) ou das opiniões nem sempre (aliás, raríssimas vezes) elegantes de Eu-rico Miranda, ou na defesa incontestável dos pênaltis favores assinalados em são Januário, ou ainda do eterno falatório no beco nosso a cada clássico dos milhões

Das trevas que culminaram no ocaso da segunda divisão nacional à arrancada sob o sol que se pretende medonho em derrame de luz com novas glórias vindouras, trajetória iniciada com a Copa do Brasil 2011, do já eterno e posicionado na galeria dos heróis vascaínos, o agora e para sempre imortal e idolatrado Éder Luis, o Jorginho Carvoeiro deste século, para que volte o tempo do imbatível Expresso da Vitória, das exaltadas comemorações dos Brasileiros de 74-89-97-2000, das consagradas festas dos Estaduais de 77-82-87-88-92-93-94, do inesquecível tri internacional Ramon de Carranza 87-88-89, da estratosférica conquista maior da Libertadores da América de 97... ou seja, para que se confirme o retorno triunfal de um gigante do futebol, o Clube de Regatas Vasco da Gama.

Sei que algures, naquele distante lá onde outros dizem que a coruja dorme, onde a bola da vida atravessa outra meta astral, naquela noite de 8 de junho de 2011, sobre um coração de regata a cruz de malta pulsou mais forte em intermináveis gritos de Vasco navegando na voz do tio de todos nós, o saudoso Pepa.


Ricardo Riso
13 de junho de 2011

* do caderno Esférico Temp(l)o do Gol, da série Babilônia Blues

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